Esse texto foi publicado pela primeira vez no dia 02/04/2014 no Medium

Eu as vezes me preocupo quando leio um livro que comprova algumas crenças que eu tenho. Fico assim porque corro o risco de estar enganado e simplesmente passar a reforçar esse erro. Uma das últimas vezes que passei por isso foi ao ler Acredite, estou mentindo — Confissões de um Manipulador das Mídias.

Nesse livro, Ryan Holiday conta suas histórias de como explorou o comportamento previsível de jornalistas e blogueiros para promover produtos e clientes que representava. Holiday é o cara do marketing da American Apparel, marca americana de roupas que promove algumas campanhas um tanto polêmicas.

Em algumas palestras que trata sobre o assunto, Ryan argumenta que no momento que o marketing se misturou ao jornalismo a informação que recebemos passou a ser duvidosa.

O filme “Diário de um Jornalista Bêbado” também mostra uma situação onde o personagem de Johnny Depp se envolve em um trama onde um profissional influente que trabalha com RP o contrata para escrever histórias que serviriam para evitar revoltas e comentários negativos sobre um empreendimento em fase de construção em uma ilha paradisíaca de Porto Rico. Em determinado momento o RP explica como utilizar os jornais para que determinadas pessoas conquistem o que é de interesse próprio.

O filme se passa em 1950 e o livro é bem atual.

Quando se misturou informação com negócios, o trabalho do jornalista se tornou muito complicado.

Vamos pensar quando os jornais passaram a ter um modelo onde empresas tentavam se consolidar e gerar receita. Nos primórdios era com a venda nas ruas, não com assinaturas. Como que o Jornal A iria chamar a atenção do público se o Jornal B e C também estavam na rua?

Simples. Vendedores nas ruas gritando as manchetes mais atrativas. Nem sempre eram verdadeiras. Hoje isso mudou para títulos de posts em blogs que sirvam de isca. Existe até uma “regra”, um exemplo a ser seguido: o Upworthy. Títulos que servem de isca e geram milhares e milhares de cliques. Em um mundo onde a informação necessita vender (seja jornal, revista ou anúncios), o que menos importa é a verdade.

Não quero dizer que todas as notícias são mentirosas, mas muitas apenas desinformam. Quando a verdade vem pela metade em qualquer matéria jornalística ela deve ser descartada. Aliás, deveria ser mas sabemos que não é assim. As pessoas compram a ideia, formam sua opinião e compartilham com seus pares. Como tendemos a viver em grupos de pessoas que possuem crenças semelhantes, nosso grupo compra a mesma ideia e isso vai se replicando até que a meia-verdade (ou até mesmo uma mentira completa) vira a “realidade”.

O mundo conectado e de redes sociais replica isso muito mais rapidamente. E afeta os dois lados: o do leitor e o do jornalista.

Eu vi por duas vezes boatos criados na internet serem tratados como verdade por jornalistas esportivos aqui no Rio Grande do Sul. A torcida criou jogadores que o Grêmio estaria contratando e resolveu começar a falar nas redes sociais. Um jornalista de segunda linha viu e publicou como verdade. Um mais conhecido entrou na jogada até que os que possuem certo status repetiram a mentira. A torcida fez de propósito. Sabia que a falta de esforço para checar informação virou regra. A impressão que se tem é que o jornalista médio passou a simplesmente replicar o que lê na internet e o leitor médio passou a simplesmente replicar o que lê do jornalista. Isso não é bom pra ninguém.

Esse é o caminho para os HOAX: começa em um site pequeno, se prolifera nesse meio alternativo, chega em alguém mais influente e por fim vira notícia.

No livro de Ryan Holiday ele conta que deu entrevistas e apareceu como especialista em diferentes áreas (as quais não sabia nada) usando um site onde o propósito é jornalistas acharem fontes. Então os profissionais postam o que procuram e pessoas se oferecem como fonte. Isso existe aqui no Brasil e eu fico pensando: o quanto isso realmente colabora para que a informação que recebemos seja de qualidade e o quanto isso colabora para termos profissionais melhores?

Sei que não vai ser todo dia que furos de reportagem irão noticiar algo surpreendente, importante e que mudará a vida das pessoas. Mesmo assim qualquer notícia precisa ser verificada com muito cuidado antes de ser publicada. Quando vivemos num limbo onde é tudo feito por cima e sem clareza, passamos a ser manipulados. O marketeiro se aproveita disso e faz lobby para que o que está vendendo seja notícia. As empresas de comunicação se aproveitam disso para gerar conteúdo que venda, que gere lucro. E a partir disso a função desses agentes fica distorcida.

Não vou me iludir que conseguimos ser imparciais. Mas precisamos ser justos. Todo mundo que for colocar suas ideias no papel, mesmo que seja para relatar algo, vai se guiar por suas crenças. Por sua ideologia. O que precisa ser feito para amenizar isso é ser 100% verdadeiro. É dizer que linha política segue. É dizer que de vez em quando escreve algo promovendo um produto. No momento que as pessoas deixam claro o que são, seus julgamentos serão mais reais. Ela é o que é, e todos irão enxergar elas dessa maneira.

Quem tem o poder da informação, tem o poder sobre as pessoas. Quem atrai mais pessoas é o que ganha a briga no mercado. O marketing tem como finalidade gerar receita, o jornalismo não. Quando isso se mistura acabamos criando realidades com uma certa irresponsabilidade. Temos o poder de manipular decisões econômicas, legais e mudar o rumo de uma nação. Temos o poder de criar bilionários e levar a falência tantos outros.

A (des)informação move o mundo.