Alguns meses atrás eu comecei a escrever um texto contando a minha experiência no Route onde o foco era o que eu acreditava que fizemos errado.

Fiquei na dúvida se deveria publicar, mas um post do meu amigo e ex-colega Luiz com o título “Como quebrar duas startups em quatro anos” no qual ele conta a experiência dele no Busca Acelerada e no próprio Route, me inspirou a compartilhar a minha visão do que aconteceu.

A equipe do Route nunca conversou sobre o que nos levou a chegar ao fim sem sucesso mas acredito que todos temos em mente as mesmas conclusões em diversos pontos.

Sei que depois que temos o resultado fica fácil olhar pro passado e contar uma história para justificar o que aconteceu. Tudo fica claro.

Ter uma visão do que fizemos errado não significa dizer que teríamos sucessos fazendo o oposto, mas sim que nossos desafios seriam outros. Nesse caso também é possível olhar pra trás e ver pontos bem errados, afinal poderiam ser aprendidos em qualquer manual “Criando uma Startup 101” (ou lendo o famoso A Startup Enxuta).

Posso dizer que cometemos erros em todas as frentes do negócio: marketing, vendas, desenvolvimento de produto e em decisões estratégicas do negócio.

Foi um pacote completo.

Então, vamos começar do começo. O que era o Route?

A melhor ferramenta de automação de marketing do mercado

O Route era a nossa visão do que deveria ser uma ferramenta de automação de marketing. A ideia foi concebida e começou a ser desenvolvida na metade de 2013.

Surgiu como uma resposta a empresas como HubSpot, Marketo, Eloqua e todas as outras que eram caríssimas e quadradas.

A nossa teria o melhor motor para dar início a um fluxo de automação. Seria flexível o suficiente para atender diferentes necessidades de uso. Integraríamos com as melhores ferramentas do mercado.

Utilizando todas as possibilidades de uso do Route (implementando toda a parte técnica que envolvia utilizar nossos métodos JavaScript) o profissional de marketing tinha tudo pra fazer chover.

Nós descobríamos informações dos leads apenas pelo email deles. Era possível colocar nos fluxos emails que seriam enviados diretamente da caixa de entrada do usuário. Imaginem as possibilidades!

O Route era a ferramenta certa para profissionais de marketing modernos. Uma ferramenta para gerenciar todo o ciclo de marketing e vendas.

Olhávamos os concorrentes e parecia que era só dar os primeiros passos que em seguida estaríamos com tudo no mercado.

Como uma ferramenta tão boa como o Route poderia dar errado?

Explico.

Criamos uma solução para resolver nossos problemas internos e não o dos outros

Sei que muitas startups e ideias inovadoras, ou ao menos que ganham destaque, surgem de dores que os criadores tem e percebem que o mercado também tem.

Mesmo assim o processo de ir validando aos poucos o produto é muito importante.

O Route quando foi concebido como uma ideia tinha como foco atender uma empresa específica. Empresa a qual bancou a operação do Route até o fim.

Como a equipe sempre imaginou que estava no caminho certo, construiu toda a plataforma validando apenas internamente. Nós éramos os consumidores e pensávamos que lá fora, na rua, tinham mais consumidores como a gente.

Estávamos enganados.

Quem chegava ao Route tinha necessidades diferentes, dores diferentes. Buscavam soluções para problemas que nós não havíamos imaginado.

A gente olhava o Route e pensava: “Nossa ferramenta é muito boa e fácil de usar!”.

Os usuários olhavam o Route e pensavam: “Parece que é mesmo uma ferramenta boa. Mas, como ela funciona? O que eu posso fazer? Parece um pouco complicada”.

Construímos muitas funcionalidades e levamos muito tempo para colocá-las no ar. No fim tivemos que cortar muitas delas e não conseguimos mostrar o valor real das que ficaram porque demoramos muito para entender o que nossos usuários realmente queriam.

Quando tentamos colocar em prática o que todo mundo fala sobre gerenciamento de produto, de ir conversar com os usuários, já era tarde demais e não conseguimos fazer as mudanças necessárias.

O Beta eterno

O fato de termos ficado muito tempo na parte do desenvolvimento de produto decidimos que o Route seria gratuito enquanto estivesse em Beta.

Esse Beta durou 1 ano e meio.

Desde o dia 1 do Route começamos a capturar leads interessados em nosso site. Mas só liberamos acesso ao produto quando estávamos terminando o ano de 2014. Na verdade pensamos em liberar acesso bem antes mas sempre pensávamos: “Hummm, ainda não tá legal o suficiente”.

E lá ia mais tempo.

Estava estampado lá no site e na nossa comunicação Free while in Beta. Gerávamos alguns leads que tinham na cabeça o Free while in Beta e só fomos começar a falar com eles em outubro de 2014 quando enviamos os primeiros convites.

Quando começamos a convidar usuários que não eram do nosso grupo de amigos (nessa época as empresas RedeHost, Umbler e nós mesmos internamente usávamos o Route) vimos que as pessoas não estavam usando de fato a ferramenta.

Criavam conta, mexiam um pouco, nos enviavam email com algumas perguntas mas não criavam fluxos de email automatizados.

Isso foi nos preocupando, conversávamos internamente mas não tivemos nenhum processo de fazer um estudo, uma pesquisa com essas pessoas pra entender o que estava acontecendo.

De outubro de 2014 até agosto de 2015 ficamos em Beta sem ter buscado entender profundamente o motivo dos usuários estarem tão pouco engajados.

Assumimos que era um problema de produto apenas: nosso design não é bom o suficiente para guiar os usuários na ferramenta.

Decidimos que o certo a se fazer era uma mudança radical na interface.

Já havíamos tirado algumas features porque pensamos que muitas delas só confundiam. O Lead Scoring e a possibilidade de eventos de Page View foram duas dessas funcionalidades.

Criamos mecanismos para diminuir a barreira de entrada.

Um exemplo foi que nessa época lançamos o integrador de formulários automágico. Como não tinhamos um criado de formulário como outras ferramentas, era necessário que o usuário utilizasse um código JavaScript para fazer essa integração. Muitos não sabiam como fazer então após o usuário colocar nosso tracking no site, ele já buscava formulários e automaticamente integrava o Route.

Essas mudanças para deixar o produto mais enxuto não deram muitos resultados então só podia ser a parte visual.

Trabalhamos alguns meses encerrados em uma sala para mudar toda nossa plataforma e relançar o produto.

Novamente não envolvemos nossos usuários nessas decisões.

Em agosto de 2015 lançamos a nova versão e nesse momento decidimos que estaríamos fora do Beta. Chegou a hora de obrigar os usuários a pagar se quisessem continuar usando a ferramenta após o período de 30 dias de teste.

Saímos de um Beta no qual aprendemos pouco e lançamos um produto totalmente novo que não estava em Beta (mas tinha vários problemas que deveriam acontecer só em Beta).

Quando fomos tentar vender, não tivemos muito sucesso.

Demoramos tempo demais para pedir o dinheiro dos nossos usuários

Como criamos toda nossa ferramenta sem usuários de fora e como ficamos muito tempo em Beta, esquecemos de cobrar pelo uso.

Ou ao menos explorar se nossos usuários estariam dispostos a pagar pelo que estávamos oferecendo.

No desenvolvimento de um produto, não só as funcionalidades devem ser validadas no mercado, o preço também.

O preço tem um grande peso na estratégia do que a empresa quer ser e como ela se posiciona. Ele dificilmente é somente o valor monetário, mas reflete o quanto o teu cliente vê de valor do produto em relação ao que ele espera.

O que é caro e barato pode se tornar subjetivo se teu produto entregar resultados esperados e até mais do que esperado por quem te contratou.

Nossos planos foram criados e ficaram lá. Eternamente.

Do dia 1 em que colocamos os planos no site até o último dia, eles eram os mesmos. Não mudaram. Não foram trabalhados, mesmo quando era uma dificuldade enorme vender.

Acredito que o correto seria ter tentado vender o Route mesmo quando estava em Beta. Colocar a barreira do pagamento o quanto antes pra mostrar a hora da verdade.

“Você acha nosso produto legal e nos diz isso. Então, paga por ele agora. Vocês está disposto a isso, correto?”.

O Free while in Beta ficou tanto tempo no ar que muitos já consideravam o Route uma plataforma free.

Nosso Product-Market Fit estava distante tanto no produto em si quanto no preço.

Enquanto outras ferramentas no mercado trabalhavam seguidamente essa parte, nós ficamos presos a primeira ideia.

Queríamos ser para todos então tínhamos planos que iam de 20 Dólares até mais de 1000 Dólares.

Os planos mais baratos seriam para quebrar a barreira de entrada, mas no fim se mostraram os únicos que nossos clientes futuros pagariam.

É bem difícil ver que teus usuários após o período de testes vão embora. Ninguém quer pagar.

Nesse período do re-lançamento com os planos e a nova interface, até conseguimos alguns clientes ao longo do tempo mas eles não ficavam muito tempo.

Além das dificuldades no negócio começamos a enfrentar dificuldades no produto.

A melhor ferramenta meia-boca de automação de marketing

O Route era muito bom ao mesmo tempo que não era.

Nossas melhores features, as que estavam redondas não eram as que mais importavam aos nossos usuários.

Um problema emblemático era o do tempo para enviar os emails nos fluxos. Alguns momentos eles iam no tempo certo e outros não.

Perdemos alguns contratos com clientes bem interessantes por erros básicos que cometemos e que uma ferramenta que tinha como função principal o envio de mensagens de email não poderia cometer.

O mínimo que o usuário espera é que o email seja enviado e que as informações nele sejam confiáveis, uma vez que devido ao poder de customização do Route, uma mensagem de email poderia ter muitos parâmetros que seriam preenchidos de maneira dinâmica para cada pessoa que recebesse.

A equipe de desenvolvimento do Route era muito boa. Não era um problema de um profissional ruim. Longe disso.

Vejo hoje que nossos problemas de produto eram consequência de termos criado um pequeno monstro e depois tinhamos que ir ajeitando ele.

Uma hora as coisas eram de um jeito. Outra hora de outro jeito.

Mesmo hoje não conheço nenhuma ferramenta tão flexível como o Route resolvia a parte de gatilho para campanhas automatizadas.

Só que isso não era o que nossos usuários estavam buscando primeiramente. O que eles queriam, a parte dos fluxos e das mensagens, sempre tivemos dificuldades (inclusive por sustentar até o fim a mentalidade de resolver os problemas internos nossos e não o dos clientes).

Focamos no mundo todo e não acertamos ninguém

O Route desde o início queria ser uma ferramenta internacional.

Nosso mercado era o mundo. E dessa maneira nosso mercado não era lugar nenhum.

Nossa equipe toda era nova nesse mundo da startup, do SaaS e da tecnologia de marketing. Mal conhecíamos esse mercado aqui no Brasil, imagina no mundo inteiro!

Lá fora, além de tudo, existiam vários concorrentes mais estabelecidos e outros que começavam a ganhar tração.

A gente conversava internamente assumindo que nenhuma empresa tinha ainda dominado o mercado de automação de marketing.

As pesquisas sobre o mercado mostravam que muitas empresas, a maior parte delas, não utilizava nenhuma ferramenta. Olha só que oportunidade!

Estávamos muito enganados em achar que o dinheiro estava lá, as empresas queriam gastá-lo e só faltava o Route aparecer na vida delas para que ele fosse nosso.

Conversamos com usuários e clientes dos Estados Unidos, do Leste Europeu, da Índia, da China, do Brasil. Não tinha um padrão. Cada um era único. Difícil de formar hipóteses sobre quem era nosso perfil de cliente ideal.

Depois de muito bater cabeça decidimos que era hora de abandonar provisoriamente o sonho de ser internacional e focar no mercado brasileiro.

Aqui estaríamos mais próximos dos profissionais, já entendíamos melhor o mercado e muitas empresas estavam falando sobre ferramentas de automação e de inbound marketing por causa da Resultados Digitais.

Infelizmente essa decisão de focar em um mercado mais próximo veio muito no fim.

Já era tarde demais.

O fim

Os pontos acima são os que eu considero mais relevantes olhando em retrospectiva.

Digo isso porque todos eles seriam evitados apenas lendo qualquer material introdutório sobre gerenciamento de uma Startup e sobre desevolvimento de produtos.

Todos nós já conhecíamos metodologias ágeis, todos já havíamos lido A Startup Enxuta, todos consumíamos material de qualidade sobre o mundo SaaS, das startups e do gerenciamento de produto. Mesmo assim ignoramos todo esse conhecimento na hora de por em prática no dia-a-dia do Route.

Outros erros como medo de tomar um rumo diferente de empresa e produto (cogitamos oferecer uma camada de serviço como outras empresas fazem e também surgiu a ideia de focar na parte de automação de vendas com a funcionalidade de envio de email direto da caixa de entrada do usuário) e dizer poucas vezes não também podem ter contribuido mas esses são mais complicados de perceber na hora.

Os motivos que eu relatei chegaram a ficar claros na época mas por alguma razão não conseguimos resolvê-los.

Não temos mais como saber qual seria o resultado caso a gente fizesse tudo de maneira oposta que fizemos.

Agora é apenas algo na nossa imaginação.